quarta-feira, 7 de abril de 2010

A enchente do Rio vista da Espanha

"Como está sua família?", me questionou uma colega do doutorado nesta tarde assim que entrei na sala. Tardei um pouco para entender o por que da pergunta, até me lembrar que, durante todo o dia, as televisões do país repetiram imagens das enchentes no Rio. O assunto também ganhou destaque nos principais jornais espanhóis nesta quarta-feira.
O "El País", o principal deles (em número de leitores), publicou 13 notícias sobre os alagamentos ao longo desta quarta-feira, entre reportagens, depoimentos de moradores e notícias no site do jornal. No jornal impresso, os dois repórteres enviados ao Rio fizeram um amplo relato, com muitas fotos, de como a "cidade do sol e das exuberantes praias de Copacabana e Ipanema" se transformou em um "aguaceiro de 94 mortos" em algumas horas.
A TVE, emissora do governo que lidera a audiência por aqui, também trouxe notícias e imagens do Rio em todos os telejornais do dia. De tarde, já mostrava reportagem da enviada especial ao Brasil, que percorreu "los barrios de favelas" com sandália rasteira sobre o lamaçal. Entrevistou moradores e, à noite, entrou ao vivo da Barra da Tijuca, "um lugar ainda muito alagado", de onde explicou que os lugares mais afetados eram as "zonas de favelas, construídas ilegalmente nos últimos anos e que são mais de mil espalhadas pelo Rio de 'Rraneiro'". O assunto foi o segundo destaque na seção internacional do principal telejornal da emissora, com matéria que durou 2 minutos e 40 segundos, dentro da uma hora que dura o programa.
No "El Mundo", um dos destaque foi que "nem o Maracanã se salvou do dilúvio", entre as seis notícias que publicou. Em uma delas, o correspondente Luis Tejero relata sua "viagem ao coração do dilúvio", que se limita a depoimentos do prefeito Eduardo Paes e de um taxista, provavelmente o que o levou do hotel a uma das favelas atingidas por deslizamentos, onde também ouviu uma moradora. Ali, interpretou o silêncio de um amontoado de gente ante corpos de moradores soterrados como uma certa frieza de quem, "vivendo como vivem em uma favela, já não se impressionam com nada".
No geral, as notícias e reportagem parecem reproduzir o modelo das coberturas de crises e catástrofes internacionais: muitas imagens e informações de agências, reprodução de discursos oficiais e poucas críticas a eles e com generalizações - como a da repórter da TVE, que explica as favelas como "bairros de infravivenda onde a miséria se combate frequentemente com deliquencia e narcotráfico".
O efeito dessa cobertura, que vem na carona de um interesse crescente da mídia local por causa da disputa pela Olimpíada de 2016, na qual Madri foi a principal rival do Rio pude comprovar ainda nesta tarde, com o comentário da minha colega do doutorado: "o lado bom disso é que agora as autoridades vão enfim resolver o problema das favelas".

Um comentário:

marcelo alves disse...

Sua colega de doutorado é muito inocente. Em dois meses tudo estará esquecido pelas "autoridades" e não vão fazer nada como nunca fizeram. Isso é o Brasil.